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História de Battlefield: a história de um FPS que veio do frio

É verdade que as raízes do FPS moderno surgiram da pura ficção. A Id, estúdio do lendário game designer John Carmack, acostumou jogadores a empunharem armas em primeira pessoa entre uma invasão infernal a Marte em Doom (1993) e instaurou pela primeira vez uma borbulhante cultura multiplayer nos PCs nos confins de um mundo neo-gótico em Quake (1996).

Battlefield 3 (Foto: Divulgação)Battlefield 3 (Foto: Divulgação)

Nesta época a mania eram embates acelerados, saltos gigantescos e bazucas que, com cauteloso uso, podiam ser usadas para mandar jogadores aos ares como foguetes, e alcançar pontos vantajosos a metros do chão. Tente fazer uma coisas dessas com um lança-granadas portátil em Modern Warfare 2 e veja o (sangrento) resultado!
O primeiro avanço em shooters mais realistas – e um segundo boom multiplayer pós-Quake – veio com um trio de mods realizados sobre o esqueleto do sci-fi Half-Life: Day of Defeat, Team Fortress e, claro, Counter-Strike. Mas foi com a sueca Digital Illusions CE (DICE), em 2002, que o gênero realmente detalhista de bangue-bangue começou de fato a tomar espaço no mercado. O jogo em questão? Battlefield 1942.

Battlefield 1942  (Foto: Divulgação)Battlefield 1942 (Foto: Divulgação)

Da Suécia com amor 
Como talvez não poderia deixar de ser, as raízes de Battlefield vão fundo em ficção. O jogo que acabou servindo de molde para o título era na verdade um sucesso cult criado pela também sueca Refraction: Codename Eagle, de 1999.

O jogo se passava em 1917, em uma Rússia de faz-de-conta. A Primeira Guerra Mundial jamais havia acontecido e a relativa paz na Cortina de Ferro permitiu aos “camaradas” organizam um poderoso arsenal sci-fi e aterrorizar a Europa. A campanha tomava segundo plano, e foi o incrível multiplayer responsável por chamar a atenção de público e crítica.
O jogo também chamou a atenção da DICE, que então era uma relativa novata: seus funcionários recém-formados se aperfeiçoaram na criação de demonstrações de engines e em simuladores de fliperama e corrida com sofisticados sistemas de física. O agregamento das duas companhias – Refraction e DICE – ocorreu pouco depois do lançamento de Codename Eagle, e a equipe logo passou a trabalhar em cima do motor gráfico do game, o chamado Refraction 1.

A ambição do time original de Codename Eagle era um título em que tanques, navios, aviões e soldados lutassem uns contra os outros em uma só arena, da maneira mais natural e fluida possível. Era um trabalho e tanto, mas uma experiência demasiado atrativa para testar os sistemas de física da DICE, e ver até que ponto essa anarquia militar poderia ser levada. Ou mesmo se ela seria possível. Com os sucessos da série Pinball e do simulador futurista Motorhead, não é como se os bolsos da DICE estivessem vazios.

Mesmo assim o trabalho em cima do que seria Battlefield 1942 levou um bom tempo, e só depois de uma reformulação empresarial e uma parceria da gigante californiana Electronic Arts, o jogo viu a luz do dia. O que era então encarado como mais um shooter de Segunda Guerra Mundial (é, o preconceito ao redor desse tipo de coisa tem raízes bem profundas) chegou como uma grata surpresa: dúzias de jogadores se reuniam em um amplo mapa de jogo, podendo controlar soldados (com papéis variados), tanques, aviões e até porta-aviões inteiros, saltando de uma especialidade a outra em meros minutos!

Battlefield 1942 era um milagre da geração Y – um game multitarefa e jamais satisfeito em cumprir o mesmo papel por muito tempo – e foi um dos poucos jogos do gênero a terem sua engine criticada por não ser “realista” o bastante.
Em plena expansão 
O jogo virou um sucesso em LANs pelo mundo todo e estima-se que algo em torno de 4,5 milhões de jogadores já passaram algum tempo entre as recriações de Stalingrado, a praia de Omaha, Guadal Canal e Berlim, que servem de arena mais que dignas aos épicos embates multiplayer do título.

Battlefield: Vietnam (Foto: Divulgação)Battlefield: Vietnam (Foto: Divulgação)

Com um estrondo destes não é de se imaginar que as engrenagens da franquia começaram a estalar bem cedo: duas expansões foram lançadas em 2003. Em fevereiro oito novos veículos e seis mapas foram adicionados com Road to Rome, e, em setembro do mesmo ano, Secret Weapons of WWII não apenas trouxe um pouco de ficção para Battlefield (uma estratégia rara na série), mas também pavimentou um importante avanço: partidas multiplayers em que jogadores deveriam cumprir uma série de missões específicas.
Pioneirismo temático 
Hoje em dia, com Call of Duty sendo o grande hit, é fácil esquecer que a série “Battlefield” foi pioneira em muitos sentidos. Em 2004, aproveitando o gás da franquia, a DICE decidiu levar sua série além da Segunda Guerra, e a escolha não poderia ser mais polêmica:Vietnam, como o nome mais do que sugere, explora os conflitos em Hanói e a forçosa retirada das tropas americanas em sua mais questionável campanha – isso tudo seis anos antes de Call of Duty: Black Ops.

Battlefield 2 (Foto: Divulgação)Battlefield 2 (Foto: Divulgação)
Mas para jogadores brasileiros, Battlefield: Vietnam foi mais do que clima tropical e a introdução de combates assimétricos (americanos contavam com veículos, vietcongs com tática de infantaria). Ele foi também um dos primeiros games de peso a ter lançamento oficial no país no mesmo dia que nos Estados Unidos. 

A EA, que desde 1997 tem escritório no Brasil, foi responsável por localizar e trazer boa parte de seus títulos, o que a fez chegar a abocanhar uma fatia de 60% do mercado de games nacional antes de ter suas operações no país assumidas pela Warner Bros., Vietnam foi um dos primeiros e mais impactantes exemplos.
E não foi só o Vietnã. Enquanto Medal of Honor e Call of Duty continuavam a enxugar cada preciosa gota dos Fuhrers, Panzerschrecks e chucrute, a DICE deixou definitivamente o campo alemão da 2ª Guerra Mundial com o lançamento de Battlefield 2, apostando, por sua vez, em panelas de pressão recentes como o Oriente médio e a China. Uma mudança drástica que só seria adotada pela competição dois anos depois.

E não foi apenas a introdução de caças e metralhadoras automáticas que fez de Battlefield 2 um sucesso.O germe de perks, sistemas de evolução em nível e itens que revolucionou o gênero pós-Modern Warfare já estava aqui, na forma de um sistema de ranking que encorajava o retorno constante às partidas e dava até mesmo ao perdedor algum grau de vitória.

Em má companhia 
Em 2007, pressionada pela própria competição que ajudou a inspirar (como o cinematográfico Call of Duty Modern Warfare, da Infinity Ward) e pela necessidade em mergulhar no já frutífero mercado dos consoles de última ponta (PS3 e Xbox 360), a DICE começou seu trabalho em cima de um novo motor gráfico, e desta vez ser capaz de renderizar rotinas de física não seria o bastante. Era preciso ser bombástico. Cinematograficamente, inclusive!

Foi assim que nasceu a Frostbite, uma engine proprietária capaz não só de criar mapas amplos e objetos detalhados, mas de fazê-los voar em pedacinhos com uma combinação de conteúdo procedural e sistemas de partículas que garantem que nenhum tiro ou explosão produzirá exatamente o mesmo efeito, e, ao mesmo tempo, que nenhuma parecerá sem graça. Some isso a um efeito de iluminação que valoriza o exagero e um sistema de som dinâmico que dá sempre prioridade ao barulho mais ensurdecedor do ambiente e é fácil ver onde a equipe queria chegar.

Battlefield: Bad Company (Foto: Divulgação)Battlefield: Bad Company (Foto: Divulgação)

O primeiro fruto da Frostbite foi Battlefield: Bad Company (2008), um game cujo foco foi divido entre uma campanha multiplayer nos moldes da série e um modo para um jogador que envolvesse todas as explosões e luzes da engine em uma narrativa dirigida por personagens inusitados e altas doses de adrenalina.

Foi o primeiro grande foco da companhia em uma campanha narrativamente satisfatória desde seu menos afortunado experimento em consoles com Battlefield 2: Modern Combat (2006), mas o jeitão mais pastelão da história (envolvendo um grupo militar de desordeiros boca-sujas) passou batido para um público que já estava, em sua maioria, atraído pelo estilo a la David Russell adotado em peso pela trama de Call of Duty: Modern Warfare.
Bad Company não se ateve apenas ao modo single-player, claro, e sua aposta no multiplayer era realmente notável. Não apenas dando aos jogadores arenas amplas e várias saídas estratégicas, a DICE incluiu a maior força de sua engine direto no gameplay do jogo: a oportunidade de colocar 90% do cenário abaixo com suficiente poder de fogo. Pontos estratégicos ou zonas de refúgio podiam ser completamente niveladas, trazendo qualquer jogador infeliz o bastante a uma súbita morte. O layout do mapa, então, era uma espécie de labirinto pronto para ser mudado ao bel prazer dos jogadores.

Battlefield: Bad Company 2 (Foto: Divulgação)Battlefield: Bad Company 2 (Foto: Divulgação)

Com tanta coisa a considerar – entre elas a assustadora possibilidade de morrer por esmagamento – é natural que a sequência (Battlefield: Bad Company 2, de 2009) tentou dar ao jogador um maior senso de espaço e ação. Uma câmera que mostrava quem foi seu último assassino foi uma das maiores adições, e um level design mais coeso demonstrou não só a capacidade do time em trabalhar com o motor Frostbite, como também a importância de um balanceamento bem ponderado mesmo quando todo o cenário pode ser detonado.

Trazendo de volta a mesma equipe do anterior, um conhecimento mais profundo das capacidades da engine da série e, claro, uma verba de produção de dezenas de milhões de dólares, Bad Company 2 era maior e melhor em todos os aspectos – até a narrativa ganhou uma carga absurda mais pontuada, colocando os amáveis bastardos da série contra uma arma capaz de criar tsunamis.

As partidas multiplayer, entretanto, continuaram relegadas à ação em solo. Caças e jatos – já ausentes em Bad Company – não se encontram aqui, e a única opção para os ases de plantão são os helicópteros. A capacidade de deitar-se no chão também não retornou, tornando o dia de franco-atiradores um pouco menos colorido. O foco é mesmo na ação direta, e com a mecânica de destruição ambiental e armas automáticas cujo verdadeiro potencial está na média-distância, é de se entender as limitações.

Um futuro para lá de próximo 

A DICE está prestes a retornar ao front este mês com Battlefield 3, um jogo que promete visuais ainda mais refinados, um sistema de colisão e dano de maior impacto e até um enfoque maior no aspecto social, incluindo uma rede social completa e versátil exclusiva para os jogadores do game. Em muitos aspectos, é muito mais uma evolução do que uma revolução – o que é admirável vindo de uma série que já foi da Segunda Grande Guerra aos confins futuristas de Battlefield 2148.
Mas a DICE ainda se orgulha de suas raízes suecas, e é esse tipo de tempero próprio que sempre dirigiu as virtudes de Battlefield: um jogo tão seco, frio e calculista, e, ao mesmo tempo, tão exuberante quanto o árduo e belo clima ártico.

Nerd Tatuado

Faustino Neto- O Nerd Tatuado Editor geral, editor de vídeo, fundador Ocupação: Empresário, blogueiro , youtuber, social mídia, fotógrafo, colecionador. Base de operações: Arapiraca/Alagoas Ações Nerd: Livros, Games, RPG, HQ, cinema, STAR WARS, colecionáveis, fotos , tatuagem, Simpsons, breanking bad, Game of thrones e outras series Poderes mutantes: Ter lag quando estou conversando Viaja sem sair do lugar