Resenha | Bojeffries – A Saga, de Alan Moore
Antes de ser celebrado como um dos maiores autores de quadrinhos de todos os tempos, Alan Moore já se aventurava em projetos diversos e inusitados. Poucos são os que sabem que o autor de “Watchmen” e de “A Piada Mortal” já produziu tiras de humor, com um gato que lembrava Garfield e até teve um ensaio de retorno em 2016. Mas para quem não conhece esse lado mais cômico, tem agora oportunidade de o conhecer através do volume inédito no Brasil de “Bojeffries – A Saga”, lançado pela Devir este mês.
O volume reúne aventuras produzidas ao longo de décadas e uma história de 24 páginas feita exclusivamente para a edição. Como pano de fundo para as histórias, acompanhamos Jobremus Bojeffries e sua família de monstros, os adolescentes Ginda e Reth, os tios Raoul e Festus, um bebê e o Vovô Podlasp. Entre familiares que são um vampiro e o outro um lobisomem, um vovô que parece ter saído de um dos contos de Lovecraft e outras bizarrices, o que mais chama a atenção são as situações insólitas.
A ambientação lembra bastante a que conhecemos através das da Família Adams. A diferença é que fornece a base para que as pequenas tramas possam sair da simples repetição de dramas sob a ótica dos monstros. Assim é possível fazer comentários pontuais sobre a nossa realidade. Críticas à cultura burguesa não podem faltarem se tratando do rouxinol. Com bastante humor britânico e unindo as gags à situações cotidianas, Moore algumas vezes deixa de acertar, mas é uma obra que vale a pena conhecer.
Publicado originalmente na revista “Warrior”, onde Moore também estrou “V de Vingança”, “Bojeffries – A Saga” conta com uma arte caricata e amigável de Steve Parkhouse que lembra publicações da MAD. O estilo do desenho ajuda bastante nos efeitos de humor involuntário do ambiente insalubre das relações suburbanas, sempre perturbadas pelas desventuras dos protagonistas. Difícil dizer que este texto tenha sido influente, em parte por ser bastante obscuro no meio pop e em parte por não acertar sempre. Mas quando acerta, obras que buscam satirizar e reinventar os monstros clássicos poderiam aprender uma ou duas coisinhas para pensar fora da caixa.
A reunião de quadrinhos nesta edição é sombrio e surreal, mas há de se notar uma coisa. As primeiras histórias, escritas na juventude de Moore não eram cínicas. Já a nova história, “Depois que eles eram famosos”, esbanja cinismo. Reflexo de Moore que com o tempo passou a ver sua vizinha com muito mais críticas que antes. Basta acompanhar o autor em qualquer uma de suas entrevistas e aparições públicas, e o mesmo surge em sua obra. O mesmo se pode ver no exemplo da tira que ilustrei acima, em comparação com as primeiras mais de trinta anos atrás. Infelizmente, essas tiras permanecem inéditas no Brasil, mas “Bojeffries – A Saga” tem muito as contar sobre um dos maiores autores da nona arte em toda história.
Bojeffries – Saga
por