Bem-vindos a bordo – Sucesso de crítica e nada mais que isso.
Alguns filmes produzidos pela sétima arte conseguem criar uma boa conexão com o grande público, embora sejam esnobados pela crítica especializada, como ocorreu com a clássica comédia “As Branquelas” (2004) ou mesmo com o suspense “O Código da Vinci” (2006). Em contrapartida há aqueles longas que destacam-se em grandes festivais de cinema e são completamente ignorados pelo grande público como os vencedores do Oscar de melhor filme “O artista” (2011) e Nomadland (2021).
O drama Bem-vindos a bordo, com estreia prevista nas telonas para o próximo dia primeiro de dezembro, facilmente enquadra-se na segunda categoria de filmes, uma vez que sagrou-se vencedor do prêmio Gan Foundation Award for Distribution no Festival de Cannes de 2021, embora conte uma história com pouquíssimo apelo ao grande público.

O drama que é escrito e dirigido pela dupla Emmanuel Marre e Julie Lecoustre, acompanha a trajetória da comissária de bordo Cassandra Wassels (Adèle Exarchopoulos), uma profissional pouco motivada empregada em uma companhia aérea doméstica que embora não lhe proporcione as melhores condições de trabalho, lhe permite manter seu cômodo estilo de vida, baseado em festas com amigos do trabalho, acesso constante a redes sociais e encontros amorosos casuais.
Durante o filme fica clara a intenção dos cineastas em mostrarem o alto grau de superficialidade na vida da protagonista, que possui uma rotina profissional na qual a aparência é o que realmente conta, de modo que quaisquer sentimentos negativos ou problemas pessoais devem ser internamente reprimidos para que a imagem de credibilidade e serenidade da comissária de bordo, e consequentemente da sua companhia aérea, não sejam prejudicadas.

Enquanto Cassandra vive sua vida quase que num modo automático, ela nutre o desejo de alçar voos mais altos e entrar em uma empresa aérea de renome, com um salário maior e melhores condições de trabalho, mas ao mesmo tempo encontra-se tão agarrada ao seu mundo limitado que não consegue encontrar forças para dar o primeiro passo em direção à concretização dos seus sonhos.
Nesse ponto o filme esboça uma contundente crítica ao modo de vida superficial dos jovens de hoje, que estão tão acostumados a facilidades rotineiras como o fast food ou o delivery, que quando deparam-se em suas vidas com algum tipo de exigência maior ou conhecimento mais aprofundado, preferem desistir antes mesmo de tentarem alcançar seu objetivo.

Após sofrer um revés profissional, Cassandra é obrigada a deixar seu emprego e assim precisa retornar à convivência com seu pai Jean (Alexander Perrier) e sua irmã mais nova Méllisa (Mara Taquin) na casa da família. No seu novo ambiente a protagonista tenta readaptar sua rotina, agora mais previsível, sem a pressão exercida pelos seus supervisores, mas que proporciona à Cassandra a possibilidade de depois de muito tempo lidar consigo mesma, entender do que realmente gosta, deixando aflorar aquela mulher que ficou tanto tempo escondida por detrás de um sorriso e de um uniforme elegante.
A proposta da jornada de autoconhecimento da protagonista é muito boa, e já foi abordada de forma eficaz em diversos outros filmes de sucesso como “Na natureza selvagem” (2007), mas aqui a execução dessa trajetória é arrastada e pouco atrativa ao público, impedindo que o expectador crie uma identificação com Cassandra e realmente torça para que a protagonista se encontre.

Nem mesmo a revelação das circunstâncias da morte da mãe de Cassandra tornam a trama mais interessante e o final pouco inspirado, no fim das contas, acaba servindo como o fechamento ideal para uma história esquecível.
Bem-vindos a bordo é aquele clássico tipo de filme que ganha prêmios, agrada a crítica especializada, mas que não consegue transmitir emoções. Um longa com boas atuações, tecnicamente aceitável, mas que falha na maneira escolhida para transmitir sua mensagem. É claro que nada disso impede que o filme seja aclamado e aplaudido em grandes festivais de cinema, como aconteceu em Cannes no ano passado. Mas nas salas de cinema pelo mundo, a tendência é que ao final da exibição do filme, o silêncio domine o ambiente após a subida dos créditos.