Crítica | O menu (2023)
“O menu” força os críticos até o extremo, e não é pela irresistível vontade em realizar na crítica trocadilhos culinários, é no seu propósito mesmo.
Enquanto nos desvia o olhar com truques e malabarismos, apresentando personagens interessantes sob a tutela de um grande elenco, o filme prepara seu terreno. Aos poucos vai demonstrando o caminho que deseja seguir, tecendo comentários sobre a forma como crítica e arte coexistem no mundo atual.
“Não coma, deguste”
Parece arrogante, mas tem propósito. Bem, é o que se espera da alta culinária e como o mundo inteiro aprendeu depois do advento dos agora onipresentes realities shows de cozinha.
Pouco a pouco o filme busca te deslumbrar com a fotografia, com a adequada manipulação dos quadros para evidenciar a narrativa e de design de produção. A relação entre o menu disposto a cada trecho do filme com a própria preocupação da construção cinematográfica não é mera coincidência.
Tudo é pensado para que o expectador nunca perca a curiosidade pelo que está vendo e para que aos poucos, os elementos da trama possam se estabelecer. Um bom exemplo é o deslocamento da personagem de Anya Taylor-Joy, discreto a principio, mas que vai se evidenciando discursiva e visualmente falando.
Do menu ao Chef
Nada disso funcionaria, e o filme pareceria profundamente pedantes, se não fosse atrelado a um discurso bem executado. E para realizar essa tarefa, Ralph Fiennes assume seu papel com maestria revelando no texto o que o filme pretende dizer. Dessa forma, ainda não não sempre de forma transparente – e ainda bem – o filme tece comentários sobre o público que esvazia a arte por um consumo por status, aponta os dedos na face da hipercrítica e também dos expectadores que buscam por uma obra de arte sem lhe prestar respeito.
E nossa, sem spoilers, o paralelo entre arte, gastronomia e prostituição foi um enorme acerto. No fim, embaixo das camadas de suspense, do thriller e das bizarrices que o comentário social exige, o que percebemos como um retro gosto (não resisti) é uma carta de amor ao fazer artístico e ao prazer de experienciar a arte.