Dentro – Um ensaio sobre a arte da solidão
Um dos mais recentes lançamentos do Prime Vídeo está dividindo a opinião dos assinantes já que muitos o consideram uma grande perda de tempo enquanto outros defendem o filme “Dentro” (inside no original) como um dos mais brilhantes e enigmáticos trabalhos de Willem Dafoe, nos últimos anos.
O longa acompanha a trajetória do talentoso ladrão de obras de arte Nemo (Dafoe) que ao invadir uma mansão para furtar quadros valiosos acaba ficando preso no interior do imóvel ao disparar acidentalmente o sistema de segurança que bloqueia todos os acessos que possibilitariam sua saída.
A história é contada praticamente em um monólogo no qual acompanhamos as infindáveis e criativas tentativas de Nemo para sair do imóvel, enquanto tenta sobreviver com os escassos recursos alimentares disponíveis. Obviamente, nesse tipo de produção em que a câmera passa quase a totalidade do tempo acompanhando a movimentação de um único personagem, o filme acaba ficando totalmente dependente das habilidades cênicas do protagonista e nesse ponto a escalação de Willen Dafoe como protagonista revelou-se uma escolha muito acertada do cineasta Vasilis Katsoupis.
O drama do ladrão deixado à própria sorte numa luxuosa cobertura em Nova York ganha, através da brilhante interpretação de Dafoe, contornos bem nítidos que conseguem transmitir ao expectador a exata noção do desespero, da privação alimentar, da confusão mental e da solidão vivenciadas por Nemo em cada etapa de sua trajetória na cobertura.
Enquanto vivencia seus momentos de solidão em sua luxuosa prisão Nemo interage de certa forma com as diversas obras de arte que decoram o imóvel, em medida similar àquela dinâmica apresentada ao grande público por Tom Hanks no filme “Náufrago” em que o protagonista vivencia sua solitude em uma ilha na companhia da carismática bola Wilson.
O filme, embora traga um tema relativamente simples, utiliza-se de uma linguagem metafórica para dar o seu recado, dando margem a inúmeras interpretações e deixando um final em aberto, e essa é uma aposta que não costuma agradar o grande público.
Mas na realidade o filme, assim como um belo quadro de pintura abstrata, necessita de significado para que suas cores realmente façam sentido. Sob esse prisma assistir ao filme sem captar a mensagem das entrelinhas nos dará a impressão de que se trata de uma história sem o menor sentido.
Contudo, se observarmos que a arte é o tema central da história e não propriamente o aprisionamento do ladrão dentro de uma cobertura, talvez consigamos enxergar que a bagunça deixada no imóvel durante a permanência de Nemo revela mais que uma simples desorganização, na medida em que cada mesa quebrada, cada parede riscada e cada móvel danificado estão permeados do significado vinculado à sobrevivência.
A arte toca pessoas de maneiras diferentes porque cada pessoa se permite enxergá-la com um significado que faça sentido para si. Não esperem um filme simples, com final feliz e previsível, mas se estiver disposto a contemplá-lo com a mente aberta, pode encontrar significado em um rabisco numa tela em branco.