Cinema

Crítica | Fences – Um Limite Entre Nós

Crítica do filme Fences – Um Limite Entre Nós

“Algumas pessoas constroem cercas para manter outras pessoas fora, mas há pessoas que constroem cercas para mantê-las dentro”. Essa passagem proferida pelo personagem Bono (Stephen Henderson), talvez seja o motor principal que move toda a narrativa do roteiro de Fences (Um Limite entre nós, no Brasil). Denzel Washington além de atuar e dirigir o longa, vai se permitir usar essa questão para trabalhar a construção de seus personagens.

Denzel Washington vive Troy Maxson, um pai calejado que tenta à sua maneira buscar a melhor forma para erigir sua família. Por volta dos anos 50, Troy, sendo negro, foi criado em uma base muito rígida e num contexto com muita segregação, de forma que isso lapidou seu caráter que soa várias vezes, durante o filme, como ultraconservador. Rose (Viola Davis) sua devota esposa a quem confiou sua vida é seu alicerce para viver em um mundo repleto de farpas.

Interessante notar que a abordagem proposta pelo cineasta é uma forma de subversão do sonho americano, aqui não têm glamour e prosperidade, uma família que no dia a dia trava apenas a vontade de viver bem, ter um futuro melhor, já que toda sua vida foi regada a muita dificuldade. Troy trabalha em limpeza urbana coletando lixo, e já nas primeiras cenas o diretor coloca em destaque o sorriso dos dois personagens que ali estão, contrastando com a visão social desse emprego que é visto com olhar muito preconceituoso.

Um dos filhos, Lyons (Russell Hornsby) é um músico fracassado que vive pedindo dinheiro ao pai para pagar os gastos dos lugares onde vai tocar. Mais uma vez o diretor aponta para o tema principal, Lyons se vê cercado pela família, mesmo morando fora de casa, o tempo todo ele é obrigado a regressar ao lar. Seu irmão Cory (Jovan Adepo) é um adolescente que sonha em ser jogador de futebol mas sofre a repressão do pai que não quer ver seus laços estreitados pela distância que, possivelmente, iria ter. Assim, Troy cerca todos à sua volta, uma sacada muito bem elaborada narrativamente.

Um bom exercício de linguagem cinematográfica é o destaque em câmeras que remetem às peças de teatro, dependendo muito do talento de seus comandados para transmitir a credibilidade e sensibilidade de cada cena, e como não poderia ser diferente, nessas ocasiões há sempre enquadramentos de câmera alinhados com alguma cerca ao fundo sempre que há um diálogo importante para a narrativa entre os personagens em cena.

Na história, Troy tem que construir uma cerca que vai delimitar a área de sua casa com a do vizinho, outra boa sacada do diretor aparece, esse processo de construção é um paralelo com sua vida pessoal. Durante essa etapa, revelações surgem e fazem com que sua relação com Rose entre em colapso. É uma relação inversa, à medida que uma (cerca) ganha forma a outra se deforma (casamento), o que torna a apreciação mais apurada do filme um bom aperitivo.

Fences (Um Limite entre nós) é competente pela simplicidade, esse tipo de construção não é novidade no mundo do cinema, mas os pontos reflexivos é que chamam atenção até pelo fato da direção ser mais básica e autoexplicativa, muito se deve ao fato de que a história em si é mais leve e não precisa de tanta interferência do diretor para ser contada.

Victor Magalhães

Formado em Ciências Contábeis, mas atuando na área financeira, atualmente estuda Direito, viciado em comprar livros (mesmo sabendo que talvez não vá ler rs), cinéfilo, gamer, aspirante a crítico de cinema, apreciador de séries e desenhos, pode ser encontrado facilmente pelos melhores bares da cidade.