Crítica | O Debate (2022)
Retratista e ao mesmo tempo provocador, “O Debate” é uma ótima estreia para Caio Blat como diretor. Retratista pois temos aqui uma transposição mais ou menos fiel da dor que foi ser brasileiro desde o início da pandemia. Provocador por discutir em tela o papel da mídia em momentos de importância história, e fazer isso também fora das telas, ao ser lançado tão próximo da corrida eleitoral.
Na trama, Paula (Debora Bloch) e Marcos (Paulo Betti) acabaram de se separar depois de 20 anos juntos. Ele é editor-chefe de um telejornal e ela uma apresentadora de televisão. Eles têm opiniões divergentes, mas continuam amigos e parceiros de trabalho. Mas apesar disso, o relacionamento de respeito entre eles não impedem que eles tenham visões distintas sobre como devem conduzir a edição dos melhores momentos do debate que a TV vai exibir – e que pode interferir na escolha de centenas de milhares de eleitores indecisos.
Antes de tudo, é preciso reforçar que o filme jamais se omite. Mesmo apresentando argumentos contrários e estimulando o debate, com ares de texto platônico, o roteiro firma suas posições com clareza.
E que se diga isso não apenas dos temas iminentemente políticos. Há aqui discussões poderosas sobre o conservadorismo da nação, as tensões sociais e mesmo a forma como pensamos os relacionamentos hoje.
Roteiro sagaz, direção competente
Trata-se de um filme que instiga desde o princípio. Assim que iniciamos a sessão, percebemos que estamos diante de uma história que nos será contada pelos diálogos. Isso é bastante difícil, exige muito dos atores que estão sempre em tela e do texto, que precisa ditar a trata sem soar gratuito.
Tendo conseguido isso, não foi nenhum surpresa perceber que Jorge Furtado e Guel Arraes assinam o roteiro. Os dois veteranos do cinema nacional já nos deram grandes clássicos da nossa sétima arte e aqui, mais uma vez não decepcionam.
Caio Blat, por sua vez, aproveita o ótimo roteiro e conduz a narrativa com inteligência e bom gosto, alternando entre passado e presente ao mesmo tempo que insere algumas imagens metafóricas interessantes.
Embora algumas possam parecer batidas – como o casal que briga enquando cada um é enquadrado por uma porta que os separa no plano -, outras são verdadeiramente geniais. Um bom exemplo é o momento em que se discute o isolamento social, com os protagonistas em um taxi que de repente passa a ser “escoltado” por entregadores de aplicativos em suas motos.
Urgência, um filme que revela a urgência
O filme não se furta de tocar em assuntos importantes. Na iminência de um golpe, a ética imprensa é mais importante que o bem estar da nação? Quem decide isso? É justo que enquanto paramos para discutir a moralidade do aborto, meninas estupradas morram em clinicas clandestinas? E o amor? Ele precisa exclusivamente ocorrer entre epnas duas pessoas, presas uma à outra eternamente?
São muitas perguntas, muitas delas sem uma resposta óbvia. E são essas perguntas que movem o filme até o fim, nos colocando na ponta da poltrona.
Se isso não for o bastante para indicar este filme, não sei o que mais seria.