O intruso – Me apaixonei pelo que eu inventei de você.
O gênero de ficção científica atrelado às complexas relações humanas tem sido explorado há anos com muita eficácia pela série de antologia Black Mirror da Netflix e até como forma de demonstrar que a gigante do streaming não é a única plataforma que aposta no gênero a Prime Vídeo lançou logo no início de 2024 o filme o intruso (Foe no original), longa sob a ótima tutela do diretor Garth Davis.
A trama futurista acompanha a história do casal Hen (Saoirse Ronan) e Junior (Paul Mescal) que mantém uma vida tranquila em uma casa isolada do interior, no ano de 2065, até que seu sossego é interrompido pela visita do desconhecido Terrance (Aaron Pierre), um agente a serviço do governo que convoca Junior para um audacioso projeto de colonização espacial com a duração de dois anos.
Embora o trabalho longínquo assegure financeiramente o futuro do casal e seus projetos, a distância por uma período prolongado poderá afetar drasticamente o seu relacionamento e por essa razão é sugerida que Júnior, enquanto está em sua jornada interestelar, seja substituído temporariamente na Terra por uma réplica quase-humana concebida por inteligência artificial para fazer companhia a Hen.
Utilizando a desculpa de ter que coletar dados para que o sósia de Júnior tenha o máximo de suas características, Terrance convida-se a habitar com o casal e obviamente esse elemento estranho ao casal abala a confiança do relacionamento, ainda mais quando Junior tem boas razões para desconfiar que Terrance tem algo a esconder.
Embora a trama utilize aspectos de ficção científica e colonização de planetas como pano de fundo o foco da história são os problemas inerentes às relações interpessoais, e por essa mesma razão ganham relevância as interpretações e também nesse aspecto o trio protagonista é um show a parte e sua interação consegue manter o público atento à trama que dispensa a utilização de recursos tecnológicos para que a história seja contada.
Em sua etapa final um plot twist muito eficiente conduz a trama para outros níveis e ajuda a explicar algumas cenas aparentemente desprovidas de propósito mostradas na primeira parte, demonstrando que uma inocente observação a um besouro pode ter um significado maior que aparenta.
Por fim, a trama revela-se um curioso ensaio sobre os relacionamentos idealizados, aqueles nos quais buscamos no outro aquelas características que nos atraem mas que nem sempre estão lá, nos fazendo questionar até que ponto vale a pena permanecer numa relação na qual nossos anseios deixaram de ser prioridade, fazendo com que nos apeguemos a um ideal de relacionamento que só funciona na teoria.
A conclusão da trama é muito coerente, finaliza bem a história respeitando a inteligência do expectador, ainda que a história não seja exatamente original. Trata-se de um ótimo drama, com um final competente pra uma história que se encaixa à perfeição ao trecho da música “De quem é a culpa?” onde a saudosa Marília Mendonça entoa dramaticamente: “Me apaixonei pelo que eu inventei de você.”