Crítica | A Acompanhante Perfeita
Assim como nos relacionamentos amorosos, nossa conexão com um filme pode ser cercada de expectativas. Um trailer, um pôster ou uma indicação podem criar uma imagem idealizada da obra antes mesmo de assistirmos. E, como nos relacionamentos, essa idealização pode levar à decepção. É nesse terreno de expectativas e surpresas que “A Acompanhante Perfeita” se insere, um filme que mistura elementos do pós-moderno e do terror para questionar não apenas nossas convicções sobre amor e tecnologia, mas também o próprio cinema contemporâneo.
Dirigido por Drew Hancock e produzido por Zach Cregger (responsável pelo aclamado “Noites Brutais”), o filme é uma experiência que divide opiniões. Ele desafia o público a refletir sobre temas como controle, desejo e a natureza das relações humanas em um mundo cada vez mais tecnológico. Qualquer coisa a partir daqui é um potencial spoiler, então siga avisado.
A premissa: Um robô de suporte emocional e as reviravoltas do terror
A trama começa de forma aparentemente comum: Iris (Sophie Thatcher), uma jovem de estilo retrô e comportamento introspectivo, conhece Josh (Jack Quaid) em um supermercado. Após um encontro casual, eles partem para um fim de semana em uma cabana à beira do lago com dois outros casais. No entanto, logo descobrimos que Iris não é humana. Ela é um “robô de suporte emocional”, criado pela empresa Empathix para ser o parceiro perfeito: personalizável, dedicado e programado para atender às necessidades do dono.
A revelação de que Iris é uma máquina abre espaço para uma série de questionamentos. Sua devoção a Josh não é amor, mas programação. Seus gestos de afeto são algoritmos. E, quando as coisas começam a sair do controle, o filme mergulha em um terror psicológico que explora os limites entre humano e artificial, controle e caos.
Pós-modernismo e zeitgeist: O filme como reflexo do nosso tempo
“A Acompanhante Perfeita” se insere em uma onda de filmes pós-modernos que desafiam convenções e exploram novas narrativas. Assim como o bem-sucedido “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” e a polêmica atual de “Emília Perez”, ele reflete o espírito do nosso tempo, questionando normas e propondo experiências audaciosas tanto na forma como no conteúdo.
No entanto, o filme também divide a crítica. Para alguns, é uma obra vazia, que não sobrevive a uma segunda sessão. Para outros, será um dos melhores filmes de terror do ano, cheio de reviravoltas e ideias provocativas. A verdade é que ele oscila entre esses extremos, sendo ao mesmo tempo fascinante e frustrante.
Lançado na “janela de janeiro” — tradicionalmente um período de filmes menos aclamados —, “A Acompanhante Perfeita” parece ter sido subestimado até mesmo pelo estúdio. E fica em nós uma sensação de que o filme poderia ser mais, especialmente em um momento em que a inteligência artificial e a tecnologia estão no centro das discussões.
Um relacionamento complicado, mas necessário
Assistir a “A Acompanhante Perfeita” é como entrar em um relacionamento complicado. Ele pode não corresponder a todas as expectativas, mas certamente deixa marcas. Com um elenco carismático, reviravoltas surpreendentes e uma narrativa que mistura terror e reflexão filosófica, o filme é uma experiência que vale a pena — mesmo que apenas para questionarmos o que realmente desejamos e até que ponto estamos dispostos a controlar nossos próprios desejos.
No fim, talvez a maior lição do filme seja justamente essa: nem tudo pode ser programado, e nem tudo deve ser controlado, mesmo o cinema de horror.