Indicados ao Oscar de melhor filme – 2023 Entre mulheres
O filme Entre mulheres é baseado no livro homônimo de Miriam Toews que foi livremente inspirado em eventos reais ocorridos em uma colônia na Bolívia, tendo sido indicado ao Óscar de melhor filme e roteiro adaptado. O título original do filme é Women Talking (Mulheres conversando) e é exatamente isso que o longa da diretora Sarah Polley oferece: diálogo entre mulheres num galpão pouco iluminado e no qual os maiores traumas sofridos por elas na colônia religiosa são expostos.
A colônia retratada no filme tem caráter religioso e mantém suas mulheres isoladas, sem acesso à educação e sem a possibilidade de se expressarem, para que possam ser totalmente subservientes aos homens e às suas necessidades e, dessa forma, possam alcançar a salvação. Obviamente que num ambiente isolado e extremamente tóxico para as mulheres, estupros e abusos de todas as formas são muito frequentes, independente da idade, e isso leva as mulheres da colônia a reunirem-se para rever a sua condição e propor algum tipo de mudança na trágica rotina de violência que têm enfrentado ao longo de anos.
As discussões apresentadas no galpão abordam dogmas religiosos, subserviência ao sexo masculino, mas acima de tudo servem para lançar luz sobre os abusos sofridos por elas e que durante tanto tempo foram reprimidos e encobertos na comunidade.
Ao assistir ao filme chegamos a ter a impressão que as mulheres são retratadas com um nível de inocência demasiado, mas se considerarmos que toda a informação a que aquelas mulheres tinham acesso era fornecida por seus algozes, que tinham interesse em mantê-las ignorantes e sob o jugo do medo, e sob essa premissa é compreensível que os diálogos sejam cercados de dúvidas e incertezas sobre reagir ou não aos ataques sofridos e como ainda nos dias de hoje esse tipo de pensamento dominado pelo medo é o responsável pelos grandes índices de subnotificações de violência contra a mulher, no Brasil e no mundo.
O cerne da discussão entre as protagonistas encontra-se no dilema entre permanecer na comunidade, e continuarem a sujeitarem-se aos abusos, ou deixar a colônia, rumo ao desconhecido, já que nenhuma das mulheres teve qualquer tipo de contato com o mundo fora dali e não saberiam nem por onde começar a procurar um novo lugar para chamarem de seu. Cada argumento é muito bem fundamentado pelos traumas vivenciados e fica nítido ao público que aquelas que querem ficar na comunidade com a esperança de que as coisas mudarão a partir dali, estão na verdade utilizando suas esperanças como forma de ocultar seu medo do desconhecido, de dar um passo no escuro e com isso apegam-se à esperança de uma mudança que no fundo sabem que jamais ocorrerá.
O filme tem um ar carregado, pesado mesmo, reforçado pela pouca luminosidade dos ambientes, pelos tons escuros das roupas das mulheres da comunidade e pela força das interpretações do Ronney Mara e Claire Foy, que ajudam a elevar o tom da revolta e da dor carregada no âmago de mulheres que compartilham histórias de vida tão trágicas.
Não se trata de um filme para todos os gostos, já que o longa, apesar dos ótimos diálogos, possui um ritmo arrastado e um cenário quase que onipresente, mas esses recursos são escolhas da cineasta para dar ênfase aos diálogos, a oportunidade de falar, um direito vedado a elas durante tanto tempo, e que ainda hoje, por mais incrível que possa parecer, ainda exige esforço para ser exercido por muitas mulheres.