Indicados ao Oscar de melhor filme – 2023 Triângulo da tristeza
Anatomicamente falando o espaço na testa situado entre as sobrancelhas recebe o nome de triângulo da tristeza, como é didaticamente explicado numa das primeiras cenas do premiadíssimo filme homônimo do diretor sueco Ruben Ostlund e que disputará na maior festa do cinema internacional as estatuetas douradas de melhor filme, direção e roteiro original.
O drama, uma incrível e tristemente atual sátira social, é dividido em três capítulos bem distintos e inicialmente acompanha o relacionamento do casal de modelos Yaya, vivida pela atriz Charbi Dean, tragicamente morta aos 32 anos acometida por uma doença súbita no ano passado, e Carl (Harris Dickison), o namorado bonitão e inseguro, diante da independência e boa dose de malícia da namorada e influencer.
Depois que o casal protagonista é apresentado chega o momento de inseri-los em um contexto maior, o que ocorre no segundo capítulo do filme intitulado “O Iate” e no qual Yaya e Carl, após de terem ganhado convites para o cruzeiro, passam a conviver com magnatas, megaempresários e toda a classe de pessoas ricas e esnobes que caberiam dentro de um mesmo navio. Um ponto bastante explorado pelo cineasta, principalmente nesse segunda parte do filme, é a existência de um enorme abismo social entre as pessoas abastadas e a tripulação, principalmente quando os primeiros adentram a esfera do politicamente correto, inclusive afirmando que todos são iguais, ainda que a próxima ação após proferir a bela frase de efeito seja degustar um caro espumante francês, na frente do funcionário do navio, sem nem pensar em lhe oferecer um gole.
Toda a ostentação e futilidade dos tripulantes do cruzeiro sofre um grande baque durante o jantar do Comandante, um evento de gala no qual o capitão do navio, vivido por Woody Harelsson, recepciona pessoalmente seus convidados que desfrutam daquilo que a gastronomia tem de mais nobre a oferecer, até que tripulantes mareados iniciam um revezamento de vômito pelo salão nobre do restaurante, mostrando que nos momentos de necessidade ricos e pobres não poderiam mostrar-se mais semelhantes.
Enquanto a tripulação tenta se restabelecer após o ocorrido, um grupo de pratas invade o cruzeiro, e depois de saquear os bens e pertences dos tripulantes, explode a embarcação, deixando todos os passageiros à deriva e aqueles que conseguiram sobreviver são levados pela correnteza até uma ilha próxima, e onde cada sobrevivente tem a oportunidade de mostrar quem realmente é.
Nesse ponto vale ressaltar que Triângulo da tristeza é o tipo de filme que dificilmente vencerá o Óscar na categoria de melhor filme mas independente de qualquer reconhecimento oficial o longa diverte como entretenimento e ao tecer uma crítica ácida em relação àquilo que nos tornamos como sociedade. As cenas escatológicas mostradas durante o jantar, não visam apenas chocar o público pela agressividade das imagens (e chocam) mas têm o condão de mostrar a podridão das classes dominantes, que normalmente fica encoberta por carros luxuosos, joias caras e corpos malhados ostentados em redes sociais.
No terceiro capítulo da trama acompanhamos os poucos sobreviventes do naufrágio lutando pela sobrevivência em uma pequena ilha na qual todas as posses ou riquezas acumuladas perdem seu valor e os ricos percebem que a única maneira de sobreviver é sujeitar-se aos caprichos da camareira Abigail (Dolly De Leon), a única pessoa que possui a capacidade de conseguir alimentos, acender uma fogueira, no melhor estilo do reality “Largados e pelados”.
Embora o terceiro ato seja menos impactante que o anterior, a crítica às elites promove ótimos diálogos e situações inusitadas, além de um ótimo desfecho que nos leva a refletir se o poder realmente consegue corromper qualquer pessoa ou se o corrompido é que é naturalmente atraído pelo poder.