Sai a criatividade, entra a reverência – Primeiras impressões de “Nível Secreto”
Talvez “Nível Secreto” não seja um nome que vá movimentar um público enorme, mas ainda assim a série nasceu com um peso nas costas. Criada por Tim Miller (Deadpool) para o Amazon Prime Video, e produzida pela Blur Studio junto a Amazon MGM Studios, a série se apoia em um legado. Antes de sua estreia no último dia 10, o material de marketing explorou muito a frase “dos mesmos criadores de Love, Death & Robots“. Apenas uma das melhores séries antológicas das últimas décadas, definitivamente a melhor em termos de animação.
A escolha de publicidade é clara, e funciona. Mas é preciso saber que a ideia aqui mudou. Não se trata mais de uma profusão de novas ideias e abordagens estéticas experimentais. Em seu lugar, entra uma homenagem à grandes jogos, em geral recentes do mercado. Soma-se a isso o fato de que a Blur Studio possui vasta experiência em trabalhar com trailers animados de jogos populares, sempre buscando o apuro técnico, uma ação espetacular e uma história capaz de engajar o público.
Uma nova onda de adaptações de videogames
De The Last of Us, da HBO, a Fallout, do Prime Video, Hollywood vive uma era de ouro das adaptações de videogames, transformando jogos clássicos em produções aclamadas por crítica e público. No cinema, The Super Mario Bros. Movie e Sonic: O Filme dominaram as bilheterias globais, enquanto na TV séries como Arcane e Castlevania expandiram as narrativas dos jogos, conquistando novos públicos. Essa tendência reflete o crescente reconhecimento dos videogames como uma forma de arte madura e rica em storytelling, além de atrair o apelo nostálgico dos fãs. Com títulos como God of War e Horizon Zero Dawn a caminho, o mercado de adaptações de jogos se consolida como um dos pilares mais promissores da indústria audiovisual contemporânea.
A era das adaptações de jogos como piada ficou no passado. A própria industria dos videogames deixou de ser uma “coisa de criança” e passou a ter ares de mídia, com todos os bônus e ônus que isso trás nos dias de hoje. Isso inclui uma tentativa desesperada se parecer sempre cool e adulto. Que outra justificativa existe para transformar Pac Man em uma ficção cientifica hard, sombria e cheia de gore? Não estou brincando: o episódio do Pac-Man é provavelmente o mais sangrento de toda a série, transformando um jogo de arcade clássico em uma história brutal de sobrevivência com muito sangue e morte.
Ainda o desafio de adaptar a essência dos videogames
Apesar de sua proposta visualmente impressionante, Nível Secreto não consegue equilibrar o peso de sua homenagem aos videogames com uma narrativa engajante. A série, com episódios de curta duração (entre 7 e 17 minutos), entrega algo que se assemelha mais a trailers elaborados do que histórias completas. O episódio de Pac-Man, por exemplo, transforma o clássico jogo de arcade em uma distopia sangrenta e cheia de gore, talvez em uma tentativa de parecer “adulto” e sofisticado – algo que, paradoxalmente, pode afastar tanto fãs hardcore quanto novatos.
A reverência excessiva ao material original parece ter paralisado a criatividade. Ao invés de explorar mundos como o infantil e imaginativo Astro Bot, a série aposta em promover projetos como Concord, resultando em episódios que carecem de autenticidade e emoção. O resultado é uma homenagem que, ironicamente, parece ter vergonha de sua própria essência: celebrar os videogames em toda a sua diversidade, sem tentar validar seu valor através de um filtro excessivamente sério ou “maduro”.
Seria muito bom se esta nova homenagem aos videogames não tivesse tanta vergonha de homenagear videogames.